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Política

Opinião | Alguns mitos sobre o caso do mito


Por: REDAÇÃO Portal

16/06/2025
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Por Mauricio Rands

Há quem não se arrisque a se informar por outras fontes que não as suas comunidades de Whatsup, Insta, Face, TikTok, Kwai ou Threads. Por desinformação, ressentimento ou desconfiança sobre a “grande mídia”. Pessoas que raramente se expõem a informações que não venham de suas bolhas. Por isso, passam a viver num universo virtual que se descola da realidade objetiva. Isso explica o paradoxo de que mesmo pessoas inteligentes acabam por acreditar em mitos. Na esfera pública essas crenças reforçam preconceitos de um senso comum que tende a ser conservador. Gente que não lê um livro ou um jornal, não assiste a um telejornal e não ouve uma rádio. Gente que passa longe do jornalismo profissional e das publicações científicas que vão além dos preconceitos e lugares-comuns por se submeterem ao contraditório e ao “fact-checking”. Aí vão algumas crenças sem base na realidade sobre fatos públicos de nossa história recente. 

​O mito seria um outsider da política e veio para combater os abusos dos políticos. Como?, se exerceu oito mandatos antes da presidência, sempre bem nutrido pelas rachadinhas?

​Ele seria uma pessoa simples, que gosta de pão com leite moça e às vezes fala demais. Como?, se ele e seus filhos têm mansões em Angra, em Brasília, na Barra e adoram consumir nos EUA? Sobretudo com os pixs dos patriotas?

​Ele seria uma pessoa leal aos seus amigos e companheiros políticos. Como?, se abandonou amigos como Bebianno, Mourão, ou o miliciano Adriano Magalhães da Nóbrega cuja morte foi vista como queima de arquivo? E, agora, os “malucos” e “coitados” que levaram chuva e sereno nos acampamentos em frente aos quartéis atendendo ao seu chamado pela “intervenção militar” e reversão do resultado das urnas?

​Ele teria feito um bom governo comprometido com a redução do estado perdulário. O problema teria sido a pandemia. Como?, se ele foi um negacionista na pandemia, distribuiu benesses eleitoreiras e deixou um deficit público com direito a calotes nos precatórios e renúncia fiscal de tributos que atingiram os estados? E se terceirizou a gestão delegando-o à direita patrimonialista de gente como Ciro Nogueira e Rogério Marinho que sequestraram o orçamento com as emendas parlamentares?

​Ele não teria praticado atos golpistas porque no 8 de janeiro estava na Flórida. Como?, se ajudou a redigir a minuta do golpe, pressionou os comandantes militares, atacou o STF e o TSE e insultou seus ministros, além de ter incentivado os acampamentos nos quartéis que clamavam pela intervenção militar e de onde saíram atos como a bomba que explodiria no aeroporto de Brasília? E se pressionou a Abin e o Ministério da Defesa para que produzissem relatórios contra o sistema eletrônico de votos para fabricar justificativas para o golpe?

​Ele não teria atentado contra as instituiçõese; teria apenas cogitado de reverter o resultado eleitoral através de estado de sítio ou GLO e o direito não pode punir meras intenções.Como?, se os crimes das alíneas “l” e “m” do art 359 do CP (tentativas de golpe e de abolição das instituições democráticas) pressupõem uma cadeia complexa de atos que foram praticados e provados pelas 900 páginas do inquérito da PF e pelas 270 da denúncia penal da PGR? Como?, se ele próprio confessou a prática de vários desses atos no depoimento prestado ao STF em 10/6/25? E se os seus auxiliares mais próximos como os generais e seu ajudante de ordem também confirmaram os fatos?

Ele estaria sendo julgado por Alexandre Moraes, que não poderia julgá-lo porque seria vítima de seus atos, e estaria sendo perseguido por um STF parcial. E não haveria provas contra ele além do depoimento de Mauro Cid. Como?, se nos crimes de atentados à democracia o sujeito passivo é a própria sociedade e suas instituições? E se o STF é o guardião último dessas instituições? E se ele próprio arregou e pediu desculpas ao relator em seu depoimento por tê-lo acusado de ter embolsado algumas dezenas de milhões de reais? E se ele próprio confirmou fatos como a afirmativa de que tentara reverter o resultado eleitoral, embora cogitando de um enquadramento mirabolante com a suposta manobra “dentro das quatro linhas“? Como?, se respondeu com um “sim, senhor” à pergunta do relator sobre se cogitava das medidas “em virtude da impossibilidade de recurso eleitoral”? Como?, se também reconheceu a existência da minuta do golpe, embora dizendo que a exibiu num telão? Como?, se confirmou os fatos, embora tentando enquadramento diverso?

​A realidade objetiva é que, como seu inspirador Donald Trump, o mito fabricava “emergência” e “comoção social” para continuar no poder e concentrá-lo mesmo tendo perdido a eleição de 2022.

Maurício Rands, advogado formado pela FDR da UFPE, professor de Direito Constitucional da Unicap, PhD pela Universidade Oxford

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