Cidade sem cascos: Os impactos físicos e comportamentais causados nos cavalos de tração
Veterinária afirma que os equinos possuem uma estrutura física que permite a prática da tração, mas, é necessária uma atenção especial com o bem-estar desses animais
Foto: Reprodução/romeroalbuquerque_
Ao andar pelas principais vias do Recife é comum nos depararmos com cavalos tracionando carroças ou charretes. A prática é proíbida por lei, criada em 2013, mas que só agora vem começando a ser implementada no cotidiano da cidade.
Dados apresentados pela gestão municipal do Recife ao Ministério Público de Pernambuco em 2023, apontam que a tração animal é realizada por cerca de 1,2 mil trabalhadores no município. Até o momento, não há uma contabilização do número de cavalos usados nesta atividade. Mas, levando em consideração o quantitativo de pessoas que utilizam esses animais para esta finalidade, muitas vezes sendo o principal ou único meio de renda e transporte para uma família, a prática levanta questionamentos acerca do bem-estar animal e humano. Outros pontos importantes a serem destacados são a condição do veículo, direção do condutor e situação física do animal.

De acordo com a Veterinária e professora de Clínica Médica dos Equídeos da Universidade Federal Rural de Pernambuco, Beatriz Berlinck, os cavalos possuem uma estrutura física que permite a prática da tração. No entanto, ela explica que essa atividade demanda uma atenção especial com o bem-estar dos animais.
“Os cavalos podem ser usados como animais de tração e, aliás, não só os cavalos, mas os equídeos de uma maneira geral, porque eles têm uma estrutura física de ossos, músculos e articulações, que torna eles capazes de exercer esse tipo de atividade física. É claro que para ele exercer essa atividade, ele precisa estar condicionado fisicamente, estar bem fisicamente para isso. Como ele também precisa ter o equipamento adequado. A carroça adequada em termos de peso, os arreios em boas condições, que não vão causar ferimento ao cavalo, e por fim, que a carga de peso nessa carroça também está adequada à capacidade física do animal”, esclarece a veterinária.
Em relação aos cuidados com os cavalos, o carroceiro Eklesiartes da Silva relata que, por ser uma prática cultural e hereditária, essa atenção aos animais costuma ser guiada pela experiência adquirida no cotidiano.
“Os cuidados são muito amplos, pela questão cultural que a gente tem, que vai passando de pai, de avô, ao decorrer da vida. A gente, cada dia mais, vai ganhando uma experiência, na questão dos cuidados com banho, na questão do medicamento natural que a gente dá também, os chás de erva-cidreira, de capim-santo”, explica o carroceiro.

Uma ação controversa relacionada à tração animal é o uso de chicotes nos cavalos. É que, quando usado para açoitar ou punir, o ato é considerado como maus-tratos. Mas, segundo Eklesiartes da Silva, a conduta também pode servir como orientação no cotidiano dos animais.
“O uso do chicote é meio relativo, né? Tem o mesmo sentido da espora, do rebenque. O problema do chicote é a forma como é utilizado. Muitas das vezes, a gente puxa a rédea e o animal não obedece, e a gente faz o quê? A gente pega, toca o chicote, o animal toma aquele susto e volta para a direção dele normal. Então o uso do chicote não é para ser usado de forma agressiva. A forma do chicote ser usado é uma forma de orientar o animal.”
Já a veterinária Beatriz Berlinck, avalia que a tração animal não precisa, nem deve estar atrelada ao uso do chicote ou qualquer outro tipo de situação que provoque dor.
“Dá, sim, para a gente ter tração sem sofrimento, é claro que dá. O cavalo, quando ele está preparado para fazer uma atividade, e essa atividade não está exigindo dele mais do que ele pode entregar, ele faz ela sem problema algum. Ele não precisa ter o chicote como um estímulo”
O impasse da discussão parte do princípio de que, no Recife, os carroceiros estão inseridos em um contexto social excludente e marcado pela desigualdade. Por sua vez, os cavalos se tornam uma parte ainda mais vulnerável deste cenário.
Diante disso, Berlinck ainda desenvolve que além da sobrecarga física, os equinos também sofrem com a falta de estrutura da capital pernambucana para as atividades de relaxamento necessárias.
“O Recife também carece de áreas onde você pode soltar esses cavalos para eles realmente poderem descansar, para se alongar, [...] para distender os músculos, para se relaxar. O fato deles saírem da carroça, para ir para a ponta de uma corda é extremamente ruim para esses cavalos. Eles não têm a liberdade de movimentos que eles precisam ter no final do dia para realmente descansar, relaxar e poder se recuperar para um outro dia de trabalho.”, defende a especialista.
A atividade de tração exige diariamente um esforço intenso para os cavalos. Por isso, a necessidade de uma avaliação imediata e profunda sobre os problemas que permeiam a prática da tração animal, bem como um empenho conjunto do poder público e setores da sociedade para que esses animais possam ter condições de vida dignas, assegurando aos seus tutores a assistência necessária na busca de novas alternativas de sustento.
Com edição de Daniele Monteiro, sonorização de Lucas Barbosa e produção de Letícia Rodrigues, reportagem Maria Luna.
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